Este é o primeiro post referente a minha peregrinação do Caminho de Santiago. Eu pretendo escrever pelo menos 1 para cada dia da peregrinação. Decidi incluir neste post algumas informações sobre o “Dia Zero” do caminho. Estou chamando de dia zero o dia que viajamos de carro da Inglaterra para a França. Talvez outras pessoas na Inglaterra possam se beneficiar desta experiência também (mas se não, eu simplesmente perdi meu tempo então). Sinta se a vontade para rolar o texto para baixo e começar direto do dia 1 se quiser. Também estou tentando algo novo para mim: Narração em voz durante o vídeo. Isto, definitivamente, está me tirando da minha zona de conforto, portanto pega leve.
Dia 0, Domingo, 24 de maio de 2015
Partimos de Bracknell por volta das 5:30 da manhã pois tínhamos que embarcar no trem das 7:30 para fazer a travessia pelo Eurotúnel. Todos os detalhes estão no vídeo abaixo:
Levou o dia inteiro para chegarmos a Saint Jean. Chegamos em Biarritz por volta das 20:00 h e em Saint Jean por volta das 21:00h. Uma jornada de mais de 15h dirigindo. Apesar que na maioria do tempo foi o Fernando que dirigiu, eu estava exausto. Dirigir não é mais para mim uma atividade tão prazerosa, como costumava ser no passado. Saint Jean Pied de Port foi onde demos início ao que é conhecido como Caminho Frances de Santiago, o qual se tornou popular nas ultimas centenas de anos por causa dos conflitos no norte da Espanha. O caminho pelo Norte hoje é conhecido como Caminho Primitivo. O caminho Frances tem algo como 820Km de extensão, dependendo da rote que você pega (caminho dos andarilhos ou estradas) e não levando em consideração possíveis distancias a mais que tenhas que percorrer se você se perder. Nós ficamos hospedados no albergue Gite Ultreia. O albergue é simples, mas cordial. Bernard, nosso hospedeiro fez nos sentirmos em casa. As camas eram confortáveis, tinham lençóis limpos e o albergue oferecia um cobertor de lã (a maioria não oferece, por isso é imprescindível levar seu próprio saco de dormir, mesmo que não venhas a acampar). O preço do pernoite foi 22€ inc. café da manhã, com reserva feita a partir da Inglaterra. Com exceção do albergue que nos hospedamos no primeiro dia que chegamos em Santiago esse foi o mais caro que pagamos. O albergue fechava as 22:00h (como a maioria), desta forma deixamos nossas bicicletas e bagagens lá e fomos procurar algo para comer. Felizmente havia um bar bem em frente, mas a cozinha deles já havia fechado. Tudo que tinham para oferecer era um sanduiche de presunto Bayonne (um tipo de presunto Ibérico), que honestamente não estava muito bom, pois tinha um monte de pedaços de ossos no meio, mas foi o suficiente para acalmar a fome. No nosso quarto haviam 4 camas e nós compartilhamos o espaço com uma senhora Brasileira do Rio e um senhor da Austrália. De barriga cheia fomos direto para cama, com o alarme programado para 6 da manhã do dia seguinte.
Dia 1, Segunda, 25 de maio de 2015
Se você chegou a ler um de meus artigos anteriores, você saberá que eu normalmente deixo a câmera rolando, tirando fotos a cada 5 segundos, para produzir um curto vídeo da pedalada depois. Essa também era minha intenção durante a peregrinação e consegui fazer isso todos os dias, exceto no primeiro dia. Na verdade, a câmera fotografou o 1o. dia da jornada, mas por uma bobeira perdi todas as fotos da câmera neste dia 🙁
O vídeo abaixo é uma compilação das fotos que fiz durante o dia com outra câmera e com meu telefone, assim como trechos gravados pela GoPRO na bicicleta do Fernando.
No dia seguinte o café da manhã incluiu além de café, vários tipos de pão, geleias e alguns bolinhos. Esteja você andando ou pedalando eu recomendo muito que leves contigo algo para comer no caminho, especialmente se você estiver fazendo a rota dos andarilhos.
Como iriamos deixar o carro estacionado em Saint Jean por 3 semanas, o Bernard recomendou que não o deixasse estacionado no centro da cidade. Ele nos falou sobre uma rua residencial bem tranquila e segura e que não teria problema deixar o carro estacionado lá. Ele estava certo! Ao retornarmos 3 semanas depois o carro estava exatamente como o havíamos deixado (com exceção das muitas folhas sobre o capo, pois eu havia estacionado em baixo de uma arvore – talvez algo que devesse ser evitado, mas estava pensando em proteção contra o sol).
Depois de café tomado, estacionamento resolvido e os alforjes prontos e carregados na bicicleta o que era para ser cedo acabou se tornando 10 da manhã, entretanto ainda tínhamos que ir à oficina do peregrino para pegar nossas credenciais. Como tinha um pouco de fila 10 da manhã viraram 11 da manhã, incluindo uma rápida entrada na igreja para alguns minutos de orações.
Achar o caminho para sair de Saint Jean foi fácil. A cidade é pequena e bem sinalizada. Pegamos algumas pequenas subidas no começo, mas a maioria dos primeiros 5 Km foram relativamente planos. Tendo visto comentários de pessoas que fizeram o caminho dos andarilhos de bicicletas, nós estávamos cientes que tínhamos que evitar e ir pela estrada. O caminho para quem vai a pé é cheio de pedras,
areia e obstáculos que dificultariam a subida mesmo para quem o fizesse com uma bicicleta vazia, quem diria para quem está com uma carregada. Talvez profissionais do ciclismo conseguissem subi-la com facilidade, mas não é o nosso caso. O vídeo abaixo é algo que encontrei no YouTube produzido por uma pessoa que subiu o caminho a pé e dá uma ideia da dificuldade (vídeo usado com permissão).
Desta forma resolvemos ir pela estrada, que presumivelmente é mais fácil comparado a alternativa, mas isso não significa que foi
fácil. Depois dos 5 Km iniciais a estrada é praticamente apenas subida com inclinações que podem variar de 5 a 15% em alguns lugares. Eu estimo que fomos capazes de pedalar (devagar) uns 80% do caminho e 20% tivemos que empurrar. Nós nos encontramos muitos peregrinos de bicicleta naquele dia, pois era feriado nacional na França o que foi vantajoso pois havia pouco trafego na estrada. O dia foi essencialmente nublado e parcialmente chuvoso. Encontramos com um grupo de ciclistas em bicicletas “speed” e sem alforjes (eles contrataram um taxi para levar as malas de cidade a cidade). Em uma dessas subidas encontramos com o Michael, que já vinha pedalando desde a Alemanha, e cujo destino também era Santiago e Finstere. Nós jantamos todos juntos naquela noite e cruzamos com o Michael várias vezes depois, durante o caminho.
De acordo com o GPS levamos pouco menos de 5h para pedalar 30 Km o que parece ser bem típico para quem está cruzando os Pirineus. Confesso que quando estava planejando eu esperava pedalar mais que 30 Km no primeiro dia, mas as subidas são muito difíceis e no momento que você chega a Roncesvalles você já está bem cansado.
O albergue em Roncesvalles é uma experiência que você não deve perder. É na verdade um magnifico prédio do século 12 com grandes Halls comprido com 120 camas, distribuídas em “alcovas” alcovas com 2 beliches cada, onde 4 peregrinos dormem. Cada peregrino tem a disposição um armário com chave (requer uma moeda de 1€), mas existem apenas 2 tomadas por
alcova. Foi provavelmente o maior albergue que ficamos durante todo o caminho. O prédio foi recentemente renovado. A equipe de voluntários que estava trabalhando quando chegamos era composta de Holandeses. De tempos em tempos os grupos de voluntários trocam por isso você pode pegar equipes diferentes dependendo da época do ano.
Ao final do hall existem banheiros masculinos e femininos. No banheiro masculino I consegui ver apenas 3 toaletes a esquerda, um conjunto de 4 lavabos (pias) no meio e 3 chuveiros fechados a direita. Apesar de parecer pouco para 120 pessoas, eu não tive que esperar para usar estas dependências naquele dia. Apesar de não ter usado, estou ciente que o albergue também tem uma cozinha totalmente equipada e uma sala de jantar bem grande. Uma coisa que foi meio chata, não para mim, pois dormi a noite inteira, mas para o Fernando, meu companheiro de peregrinação, foi que de 1 em 1 hora um dos voluntários holandeses caminhava ida e volta a distância toda do Hall. Provavelmente queria se assegurar que todo mundo estava se comportando de maneira apropriada. O barulho dos seus passos acordou o Fernando várias vezes durante a noite e sono é algo muito importante para aqueles que vão caminhar ou pedalar o dia inteiro no dia seguinte.
Nós jantamos no restaurante do peregrino ao lado do albergue e o menu do peregrino custou 10€. Tive pasta como entrada e o prato principal foi de peixe e batatas com um iogurte de sobremesa. Tudo servido com agua e vinho. Estava delicioso. Normalmente o menu do peregrino tem 3 opções a escolher de combinações entre entrada, prato principal e sobremesa. Roncesvalles é uma pequena vila e não existem muitas opções, mas existem mais alguns locais onde se pode fazer uma refeição.
Depois do jantar fomos a capela assistir à missa que é celebrada em vários idiomas diferentes. O albergue também fecha as 10 e por volta das 11 praticamente todo mundo na está dormindo.